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Aulas de Yoga minimizam sintomas de hiperatividade

12/10/2006 - 09h03
Aulas de Yoga ajudam a minimizar sintomas de hiperatividade

IARA BIDERMAN
PRISCILA PASTRE ROSSI
Colaboração para a Folha de São Paulo

Com cara de anjo e sentado como um pequeno Buda, Bruno Skaf Borges, 10, parece ser zen desde criancinha. O garoto entrega: "Eu extrapolava, era muito bagunceiro". Agitado, com dificuldade de se concentrar e de conter seus impulsos, Bruno começou a freqüentar aulas de Yoga quando tinha oito anos, por sugestão do pai, o aposentado Aidar Borges, 46.

"O Bruno era muito disperso, hiperativo. Primeiro, coloquei ele no caratê, achei que podia ajudar, mas não mudou grande coisa. Então sugeri o Yoga", conta o pai. A melhora foi acontecendo aos poucos, mas, depois de um ano, já pôde ser sentida na convivência familiar, no rendimento escolar, nas relações sociais e, principalmente, pelo próprio Bruno.

Adepto da prática há alguns anos, o pai do garoto apostou no Yoga por intuição. Mas uma tese publicada neste ano mostra que a aposta pode ter base científica. Um estudo controlado feito na clínica de psiquiatria e psicoterapia infantil da Universidade de Heidelberg (Alemanha) concluiu que o Yoga é um tratamento complementar altamente indicado para o chamado TDAH (transtorno de déficit de atenção com hiperatividade).

Segundo os pesquisadores, o Yoga mostrou-se mais eficaz do que outras práticas corporais ou atividades físicas na redução dos sintomas relacionados ao distúrbio. O estudo também mostra que os melhores resultados foram verificados nas crianças que, aliado à prática de Yoga, tomavam medicamentos específicos prescritos para o quadro.

"Uma atividade com regras e rituais bem determinados [como o Yoga] traz benefícios à criança com essas características e pode fazer com que ela melhore mais rapidamente", diz Luiz Celso Vilanova, chefe do setor de neurologia infantil da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).

Vilanova pondera que, dependendo do grau de hiperatividade, a criança pode ter dificuldade em seguir uma aula e ficar parada nas posturas. Nesse caso, a associação da prática com os medicamentos indicados contribui para a obtenção dos resultados, como aponta a pesquisa.

Para Enio Roberto de Andrade, coordenador do ambulatório para TDAH para crianças e adolescentes do IPq-HC (Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo), os exercícios de relaxamento, concentração e meditação do Yoga trazem benefícios apenas se a criança consegue estender esse aprendizado para as práticas cotidianas. "A idéia é fazer com que elas aprendam estratégias para lidar com as suas dificuldades.

Isso aumenta a chance de virem a ficar sem o remédio, mas não há garantia de que isso ocorra." Segundo Andrade, a principal causa do TDAH, que afeta entre 3% e 5% das crianças brasileiras, é genética e, na maioria dos casos, é indicada a medicação. "É mais fácil tratar com remédios para evitar desgaste no relacionamento familiar, comprometimento social e insucesso na escola", diz Vilanova.

Concentração

Freqüentemente, é na escola que os efeitos da pouca atenção e do excesso de atividade são mais notados. Quando a funcionária de cartório Maria Aparecida Arakaki Affonso, 45, foi chamada à escola de sua filha, Júlia, 6, para tratar da grande dificuldade da menina para focar a atenção nas atividades, procurou diferentes abordagens para resolver o problema.

Mesmo não sendo uma praticante de Yoga, Maria Aparecida achou que isso poderia ajudar. Hoje, comemora os resultados. "A Júlia está muito mais concentrada e acho que foi o Yoga que deu o empurrão para ela conseguir focar a atenção. Sua avaliação [escolar] melhorou, as professoras comentam, elogiam", conta.

O garoto Bruno percebe bem como o Yoga ajuda na sua vida escolar. "Levei muito "ralo" na escola, cansei. Agora uso o que aprendi no Yoga para me concentrar, faço uma "mentalização" na hora da prova. Também "estouro" menos, se alguém me xinga, entra por um ouvido e sai por outro." Ele conta que, no começo, achava que não ia gostar da prática. "Pensava que era só ficar parado, meditando, meditando... Mas não, você se envolve porque tem de usar o corpo e a cabeça", explica.

"O Yoga favorece a auto-reflexão e organiza os estímulos. Por isso, pode ser um complemento e até uma alternativa para não medicar", acredita a psicóloga Vera Zimmerman, coordenadora do Crie (Centro de Referência da Infância e da Adolescência) da Unifesp. Zimmerman afirma, porém, que a prática não pode ser considerada uma solução milagrosa.

"É preciso orientação, para ajudar a criança a agregar a experiência do que fez na aula. A prática deve ser degustada, deve criar associações qualitativas para a vida. E isso também pode ser obtido com outras atividades".

Energia focada

É comum acreditar que o hiperativo precisa de uma atividade para "gastar energia" e que, dificilmente, consegue ficar parado em uma postura de Yoga. "Simplesmente gastar energia, sem foco, desorganiza ainda mais a criança. Não se trata de quantidade, e sim de qualidade", diz Zimmerman.

A questão de saber se a criança vai agüentar ou não a disciplina que a prática requer depende da motivação do aluno e da persistência dos pais --muitas vezes, os resultados demoram meses para serem observados. Há casos, no entanto, em que podem ser sentidos quase que imediatamente. A carioca Camille Guimarães Sá Rego, 11, faz Yoga desde março.

A mãe, a analista de sistemas Marcia Regina Guimarães Sá Rego, 52, está animada com o resultado. "Quinze dias depois da primeira aula, comecei a notar mudanças no comportamento da Camille. Antes ela misturava todas as atividades. Estudava assistindo programas de televisão e ouvindo música.
Era tudo ao mesmo tempo", conta a mãe.

A própria Camille percebeu a mudança: "Agora tenho hora para brincar, ler, estudar e ver televisão. Aprendi como é bom ter calma e curtir uma coisa de cada vez. E faço isso sozinha. Minha mãe nem precisa mais pegar no meu pé".

A empresária Andréa Maria Nabhan, 35, mãe de Amanda, 7, afirma que, após um mês de prática, já percebeu mudanças significativas na filha. Entre outras coisas, o sono da menina melhorou muito. "A Amanda tinha muita dificuldade para dormir e eu também não dormia. Ela aprendeu técnicas de relaxamento e de respiração e consegue adormecer mais rápido e ter uma noite melhor de sono", diz a mãe.

Não é pouca coisa, pois as noites bem-dormidas melhoram a qualidade de vida de mãe e filha e evitam muitos atritos familiares --o apoio dos pais é fundamental para o tratamento do TDAH. "Não adianta tomar medicação ou fazer uma atividade específica se não houver mudança em um ambiente familiar desorganizado", afirma Zimmerman.

Posturas e histórias

Amanda também aprendeu a controlar a impulsividade, outra característica de hiperativos. Quando sente que vai explodir, tem um truque: o movimento do lenhador dando uma machadada, postura de flexão para a frente coordenada com a respiração, que aprendeu na aula de Yoga.

"As flexões para a frente desaceleram os batimentos cardíacos, diminuindo a ansiedade e a agitação", explica a professora Gisele Jacob, que dá aulas particulares de Yoga na academia Reebok. Jacob conta que, além das posturas ("asanas") e do relaxamento conduzido, há uma série de exercícios respiratórios ("pranayamas") específicos para hiperativos.
"As aulas são direcionadas para as necessidades de cada criança.

Se elas chegam agitadas demais, trabalhamos com posturas que acalmam e com atividades que as ajudam a se integrar no grupo", diz Ana Maria Novaes Gonzalez, professora da escola Premo Yoga, de São Paulo.

A possibilidade de estabelecer uma relação mais individualizada com o aluno é uma vantagem para a criança com TDAH, já que "costuma ter dificuldades na socialização, o que pode prejudicar o aproveitamento em jogos coletivos", diz o neurologista Vilanova.

Ângela Maria Jácomo Martinez, professora do Yoga Narayana, em São Paulo, conta que uma aula para crianças é feita de maneira lúdica, em que são propostos jogos e brincadeiras.

As posturas ganham nomes que estimulam a imaginação da criança: a do macaco, a do elefante etc. Além disso, são contadas histórias explicando a origem das posturas. "A atividade física, em geral, já é benéfica para a saúde mental. Se inclui o aprendizado de regras, noções de companheirismo e ética, fica melhor ainda", conclui o psiquiatra Enio Roberto de Andrade.

 

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